“EU SEI O QUE VOCÊS FIZERAM NO GOVERNO PASSADO” (EPISÓDIO 2)

A licitação é um processo administrativo que visa assegurar igualdade de condições a todos que desejam celebrar a assinatura de um contrato com o poder público. Esse processo é disciplinado pela Lei Federal 8.666/93, na qual estão previstos critérios objetivos de seleção das propostas para aquisição de produtos ou prestação de serviços, visando sempre alcançar benefícios sociais e vantagens econômicas favoráveis às entidades públicas. Pelo que parece, em São Gonçalo essa lei foi solenemente ignorada pelos três últimos prefeitos. Documentos que estão sendo colhidos e analisados pelo Ministério Público Federal, indicam que direta ou indiretamente Neilton Mulim, José Luiz Nanci e Capitão Nelson estariam envolvidos nas ilicitudes contidas no contrato PMSG nº 007/2016, assinado entre a Prefeitura de São Gonçalo e o CONSÓRCIO BRS COBA LOGIT, responsável pelos estudos de viabilidade técnica e pela elaboração do projeto básico para execução da milionária e polêmica obra do corredor viário interligando os bairros Neves e Guaxindiba. O procurador da República que conduz o Procedimento Preparatório (PP 1.20.30.00062/2024-7) que apura o caso, já possui um parecer assinado pelo conselheiro Márcio Pacheco, do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), reconhecendo que a suposta fraude licitatória começou no Governo Neiton Mulim, estendeu-se por todo Governo José Luiz Nanci e foi mantida pelo atual Governo Nelson Ruas. Em seu despacho no Processo nº 212.200-8/24, o conselheiro ressalta que pelo fato do contrato assinado em 2016 ter sido extinto em decorrência do prazo, aquela Corte fica impedida de intervir e determina que o caso seja encaminhado ao Ministério Público, órgão que possui competência legal para adoção de medidas cabíveis.
“Em que pese a suposta irregularidade não preencha os requisitos necessários para análise de mérito por parte desta Corte de Contas, em concordância com o parecer do Exmo. Sr. Procurador-Geral de Contas, Henrique Cunha Lima, determino a expedição de ofício ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), para ciência e adoção das medidas que se façam cabíveis no âmbito de sua competência”, lavrou Márcio Pacheco.
Ao receber o referido ofício assinado pelo conselheiro do TCE-RJ, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro o encaminhou à 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de São Gonçalo para que os agentes daquela unidade promovessem a apuração dos fatos. Todavia, ao apreciar o conteúdo do relato e das provas documentais apensadas na denúncia, a promotora titular, apesar de reconhecer a pertinência da narrativa e a procedência do farto material comprobatório, identificou que a verba pública envolvida na contratação supostamente ilegal do CONSÓRCIO BRS COBA LOGIT era proveniente dos cofres da União, optou pelo declínio de atribuição e encaminhou o caso para o Ministério Público Federal que o acolheu prontamente.
As investigações estão em curso. O ex-prefeito Neilton Mulim, que faleceu em janeiro último, escapou de ser enquadrado, mas o ex-prefeito José Luiz Nanci e o atual Nelson Ruas serão intimados em breve (muito breve mesmo) a comparecerem à sede do Ministério Público Federal para prestarem seus respectivos esclarecimentos a respeito do assunto. A situação deles nesse inquérito federal não é nada confortável. Professores de Direito que tiveram acesso ao conteúdo da denúncia, comungam a opinião de que é mais fácil um marido infiel justificar a marca de batom em sua cueca para a esposa ciumenta, do que os referidos prefeitos comprovarem a consistência jurídica desse contrato milionário ao procurador da República e ao juiz federal, caso tornem-se réus por improbidade.